20.12.11

.



jul./11

gaiola

Gaiola de cinzas grades
Gotas de chuva escorrendo, cortando o ar
O que impede de sair, as grades ou as gotas?

Estrangeira na gaiola
Pequena
E enorme
Novos estranhos rondando
Vão embora! É gaiola. E é minha.


16/jul./10

amar não acaba

Perceber que amar não acaba. O amar fica ali, quietinho, nos olhos, na boca, no estômago... até que o encontro se re-encontre. E aí é bonito demais. Tão ou mais que o encontro. Esse re-encontro danado, em que olhos, bocas, estômagos, orelhas, mãos, cílios, dedos dos pés se vêem e se re-conhecem. E nem precisa daquela dúvida do início. A dúvida é outra, mais funda. A dívida do passado, incompleto, insuficiente. Que volta para completar-se. Contemplar o passado feito presente (finalmente!), iluminando cada pedacinho de vida.



8/Nov./11







(ao reler as poesias de um menino-pássaro, de olhos pretejados de jabuticabas, para uma menina constelada de pintas, ambos distraídos, que, de tão distraídos, foram se afastando, afastando, até não ter mais volta.)

noite

A efemeridade das coisas
O encontro, a ligação
Um poema-de-fotografia
O instante registrado
Musicado, musicando

A bolha de sabão prestes a estourar
Arco-íris de sensações

A construção da confiança
Intimidade
O cheiro doce de shampoo
As descobertas (de si) do outro
O conforto-do-peito, do abraço
O sorriso gentil, de-doce-de-mel

Não quero pensar no depois
No resto do mundo
“o tempo aqui é outro”
O amanhecer virá
Mas agora a noite aconchega.


21/dez./10
Há que se traduzir em palavras aquela noite?

Sensações marcadas
O vermelho, o azul
A complementaridade das cores, das histórias,
A completude da vida

Ele, filhote, ali, conhecendo(-se)
Estranhando tudo o que (ou)via, sentindo.
Eu, filhote, ansiosa, atrapalhada, curiosa.
Nós, crianças, identificando instantes
Na tentativa de enxergar, de ver, compreender

A vermelhitude da sensação
A força, o ímpeto, o movimento
Em jogo com o sentimento azulado
A paz, calmaria, a certeza.

A mandala da história
O círculo azul-avermelhado
A mescla das cores-experiências
O roxo-resultante, a transformação





7/nov./10

16.5.11

encontro (ou tentativa)

Era uma festa qualquer. Dessas da faculdade, com gente conhecida e bêbada.
...Ela não esperava mais que se divertir com os amigos, dar umas risadas, espairecer.
...Estava escuro. A música alta e as lentes dos óculos antigos dificultavam seus sentidos. Turvo, desfocado, penumbra, vultos, barulho constante. O frio a fazia estremecer de vez em quando.
.


.
...Ele veio à cidade para ver uma peça. Nada além disso.
...Acompanhava três amigos. Antigos, como ela.
...Chegaram atrasados, a Marginal parada. O que fazer? Ouvi dizer de uma festa legal, vamos?
...Foram.
.


.
...Ela estava lá. Ele chegou.
...Eles se viram. Se viraram.
.


.
...Como reagir a um amor antigo? Como falar oi depois de tanto tempo? Como sorrir e perguntar como vai, tudo bem? Como?
.


.
...Tentaram se ignorar por um tempo, ver quem cedia e tomava a iniciativa de cumprimentar o outro. Hesitação-Excitação.
...Os dois querendo ser caçados, como prova da importância antiga de um na vida do outro.
...Até ele passar perto. E ela o segurar pelo braço.
...Oi.
.


.
...Trocaram palavras. Ovos estilhaçando sob seus pés a cada sílaba pronunciada.
...O pensamento e o sangue a mil; as frases controladas. A tentativa de esconder a tensão em todos os músculos de seus corpos.
...Na primeira oportunidade, ele diz vou dar uma volta. E se afasta.
...O ar volta em desespero aos pulmões, após aqueles longos minutos embaixo d’água.
.


.
...O mundo dela volta, mais desfocado, escuro, torto. Ele caminha, fingindo decisão ao se afastar dela.
.


.
...Eles se esbarram mais tarde, trêmulos.
...Insistem na tentativa de uma conversa “normal”. Perguntam do cachorro, do emprego, dos pais.
...A situação, pouco a pouco, fica mais leve. Os ovos diminuem. Tornam-se pontuais, apenas quando se lembram do passado comum.
...Na exata metade de uma frase já relaxada dita por ela, ele, como era de sua natureza carinhosa, toca a mão dela. Movimento sutil, quase imperceptível para o resto do mundo. Mas, para ela, que nesse momento não era o resto do mundo, muito pelo contrário, era o centro dele, era ele inteiro, aquilo impossibilitou de súbito a circulação do sangue, a entrada do ar, a movimentação dos músculos, o fechamento das pálbebras, a digestão da bebida. Seu corpo congelara e derretera. Naquele exato instante do toque, a frase se perdeu...
.


.
...O sutil toque logo se repetiu. Na terceira vez, já não era tão sutil. Então, se demorava um pouquinho mais, trocando decidido o calor das peles. O contato se intensificava. Agora, já tocava também seu rosto, num carinho delicado só dele.
...As palavras continuavam, mas a atenção era exclusiva ao próximo toque disfarçado.
...Os sorrisos dela ganhavam ar de vergonha. Os rostos avermelhados, talvez do frio. Talvez não.
...O toque escorregava, se transformando em abraço. No começo seco, rápido. Em seguida, mais demorado, apertado.
...Os rostos se tocavam; as bochechas, em contato, se reconheciam. Saudosas.
...Os narizes, com inveja, também passaram a se encostar. Quanto tempo!
...Os cílios, as testas, maxilares, queixos. Todos, no reencontro por tanto tempo esperado.
...Só faltavam os lábios, receosos. Mas, quando os olhos se viram uns no brilho dos outros, os lábios simplesmente entenderam. E se tocaram, no beijo iluminado que preenchia o mundo inteiro.
.


.
...Eu gosto muito de você, ele disse.
...Eu também gosto muito, muito, muito de você, ela em resposta. Parece que não passou tempo nenhum...
...Foram as únicas palavras que se permitiram dizer. O resto não importava mais. O não-foco, a peça, a penumbra, o frio, os amigos, a distância.
.


.
...Os dois ficaram assim por muito tempo, se reconhecendo, se encontrando.
...Mas nem de longe por tempo suficiente.
.


.
...Fica bem, como você estava, ele disse, com seus olhos de bola de gude.
...Você também.
...E voltaram, cada um para seu mundo pálido e inodoro, galáxias distantes de si.






maio/11

24.1.11



Salvador -- fev./10

8.1.11

pra minha vó.

Madrugada. A garoa fina paulistana. O vento frio nas gotinhas pelos braços nus.

Escuro, vazio. Silêncio. Só os galhos das árvores, úmidas, sacudidos pelo vento. Gotas salgadas dos olhos e gotas geladas da chuva, misturadas no rosto, no peito, na calça. A pedrinha branca guardada.

Flores amarelas. Mar.
Mar de flores amarelas. O rosto envolto nas pétalas.
Ao redor, cada pétala da família desabando, sem caule.

O dia amanhece. A garoa permanece. Cinza.
O cortejo pelo trânsito cinza de sábado de manhã. Viadutos, carros, rostos.
Cinzas.

A arena. Vermelha.
Lenços, lenços, abraço, ombro. Fundo.
O fogo vermelho. O adeus.

Garoa insistindo. As lágrimas também.
Árvores escurecidas por tanta água. Os altares nas suas bases. Flores coloridas, pedras num círculo.

O círculo que se fecha. Completo.
Fica o oco. Vácuo.
Cadê?

Os vidrinhos de perfume, as porcelaninhas, as folhinhas no chão, as roupas no armário.
À espera...

A espera é branca, asséptica.

A força se esvai. Meu rosto molhado, sem expressão.
Simples dor. O estado puro dela. Nosso.





6/dez./10
Vejo-me marcada por feridas que achava já cicatrizadas. Quanto tempo mais demorarão para fazê-lo? Não quero mais suas repercussões, seus medos, seu instinto de gato-escaldado. Quero a inocência, o entregar-se, o pular do abismo sem antes conferir o pára-quedas.

Estou aqui inteira, na tentativa da entrega. Me doo.

Me dói.

1/jan./11